sábado, março 12, 2011

Há décadas que estamos à rasca...



Também há professores «à Rasca»


Fenprof marcou contestação para o mesmo dia

Professores dividem-se entre manifestação dos sindicatos e da “Geração à Rasca”

11.03.2011 - 18:07 Por Clara Viana

Os professores do ensino básico e secundário têm estado no olho do furacão, mais de 30 mil deles estão literalmente “à rasca” todos os anos. Professores contratados, anualmente à espera do último dia de Agosto para saber se e onde vão ser colocados. Um lugar significa para muitos estar dois dias depois ao serviço a muitos quilómetros de distância, em mais uma escola provisória. Onde vão estar amanhã? No Campo Pequeno com os sindicatos? Ou nos protestos da “Geração à Rasca”?
Os professores estão divididos sobre que manifestação ir
Os professores estão divididos sobre que manifestação ir (Pedro Cunha (arquivo))
José, 31 anos, autor do blogue “Professores contratados”, anda há cerca de dez anos a “passear por Portugal”. Este ano foi colocado em Braga. Não tem dúvidas onde estará: “A minha escolha recai sobre o protesto da “Geração à Rasca” seja em Lisboa, Porto ou em qualquer lugar”. É uma escolha por identificação e rejeição.

Identificação porque os promotores dos protestos independentes de hoje têm “frustrações semelhantes” às dos professores contratados: “A frustração de sermos tratados como números, sem valor e sem futuro.” Rejeição porque, afirma, também se sentem tratados assim pelos sindicatos: “As razões que os movem são as reivindicações dos professores efectivos e não dos contratados. Apenas lembrando-se de nós quando é necessário fazer número.” Para quem governa, para quem está instalado, José deixa um alerta: “Estão a esquecer-se nós, ao esquecerem-se de nós estão a esquecer o futuro.”

No último concurso nacional de professores, realizado em 2009, apenas entraram para o quadro cerca de duas centenas de docentes. Dos cerca de 140 mil professores do ensino básico e secundário, 22 por cento são contratados. Com os cortes anunciados para a educação poderão ser os primeiros a ficar sem emprego já no próximo ano lectivo.

“À rasca estamos quase todos”

Anabela Magalhães, autora de um blogue com o mesmo nome, não está nesta situação. É professora do quadro. Lecciona História em Amarante, tem 49 anos e estará amanhã em Lisboa. Tem um plano: começar no Campo Pequeno, no plenário convocado pela Federação Nacional de Professores (Fenprof) e outros sindicatos, e “tentar acabar a tarde na Avenida da Liberdade, na manifestação convocada pela Geração à Rasca. Porque aí faria o pleno”. Vai estar no Campo Pequeno para manifestar a sua oposição “aos múltiplos ataques à escola pública de qualidade”, aos cortes anunciados pelo Ministério da Educação, que prefere poupar em professores em vez de “cortar nas obras da Parque Escolar”, e também contra o modelo de avaliação de desempenho docente. Um modelo “aberrante” que ao promover a avaliação entre pares, “corrompe a independência da avaliação” e o “trabalho colaborativo nas escolas”: “Há amigos do peito a avaliar amigos do peito e o oposto também pode acontecer.”

Mas Anabela também estará na rua, em Lisboa, para expressar o seu descontentamento "pela falta de políticas de criação de emprego, pela acentuada precariedade reservada aos mais jovens” e "porque à rasca estamos quase todos nós neste país”.

E porquê duas manifestações no mesmo dia? André Pestana, 34 anos, professor contratado de ciências, sindicalizado e promotor do movimento 3 R (Renovar, Refundar, Rejuvenescer), olha com desconfiança para a Fenprof, que anunciou a data da sua concentração já depois de os jovens do movimento Geração à Rasca terem escolhido o seu 12 de Março. Para ele, é mais uma tentativa dos sindicatos de impedirem que a sua base de apoio parta para outras. Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, explica que a data para o plenário no Campo Pequeno foi escolhida em Janeiro – e anunciada a 10 de Fevereiro - e que resultou de uma exclusão de possibilidades. Inicialmente, os sindicatos tinham apontado para uma manifestação para o final de Março, vários apoiantes propuseram a sua antecipação para o início do mês. Como o primeiro sábado era o do Carnaval e o terceiro já estava ocupado por uma manifestação da CGTP, restou o dia de hoje. “Acho óptimo que estejam professores nos dois lados. São iniciativas de origem diferente, mas que têm a mesma razão de ser: a contestação das políticas actuais”, diz.

João Labrincha, um dos promotores do protesto dos jovens, também não vê problemas na coexistência. “Há muitos professores que nos têm contactado a dizer que vão estar nas duas. É óbvio que existe uma complementaridade”, afirma.

André Pestana também queria estar no Campo Pequeno, mas irá marcar presença na Avenida da Liberdade. “Não tenho o dom da ubiquidade”. E estará na Avenida da Liberdade porque, como professor precário, identifica-se com a posição dos jovens à rasca, mas também porque eles estão a dar corpo a “um fenómeno novo”. “É um sinal dos tempos e é daí que virá a mudança e não com os velhos dirigentes sindicais". Alguns dos 3R estarão no Campo Pequeno a distribuir um comunicado onde explicitam esta sua opção. Eles “não são parvos”

Paulo Ambrósio já passou dos 40, continua a ser professor contratado de Educação Visual, actualmente não se encontra colocado em nenhuma escola. Portanto é um contratado/desempregado e sócio do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa. “A minha postura sindical é de autonomia, de independência e, tantas vezes, de oposição democrática ao status quo”, esclarece. Vai estar no Campo Pequeno onde chegará incluído num desfile promovido pela Associação de Professores de Educação Visual e Tecnológica. Por enquanto podem respirar de alivio, já que o decreto-lei que reduzia para metade o número de professores desta disciplina foi revogado pelo parlamento.

Era uma “autêntica fábrica de desemprego”, diz sobre aquele diploma. Foi uma “luta nobre e justa conduzida exemplarmente pela nossa associação profissional”, afirma. É uma das razões que o leva ao Campo Pequeno. Só que, acrescenta, “gostaria de ter o dom da ubiquidade para também estar presente no protesto da geração à rasca no qual me revejo”.

Margarida Azevedo, professora do quadro desde 1995 e uma das autoras do blogue “Uma aventura sinistra”, não estará ao lado dos sindicatos. “Tenho 40 anos, sou professora de um mega agrupamento de escolas e apesar das circunstâncias serem outras também me se sinto à rasca”, desabafa.

Devido ao que passa no país e ao que se passa com ela própria. Com uma doença oncológica, e depois de dois anos de baixa, deram-lhe 13 turmas, 300 alunos no total, espalhados por três escolas diferentes. Foi-se abaixo, mas tenciona regressar: “Sou professora por opção. Luto por justiça e estou ao lado de quem faz o mesmo”. Amanhã estará ao lado dos mais jovens. Um gesto solidário: “Não será por mim que irei estar presente mas por eles que têm mostrado muito bem que sabem o que se passa, que não são parvos e que estão dispostos a lutar. Coisa que, por exemplo, a maioria dos professores parece não querer”.

Os que estarão no Campo Pequeno irão ser chamados a avaliar o Ministério da Educação. Segundo anunciou hoje a Fenrpof, as fichas para o efeito serão entregues ao secretário de Estado da Educação, Alexandre Ventura, que receberá os sindicatos ao final da tarde de amanhã. É no ME, e após um desfile até à Avenida 5 de Outubro, que terminará a iniciativa dos sindicatos.

http://www.publico.pt/Educa%C3%A7%C3%A3o/professores-dividemse-entre-manifestacao-dos-sindicatos-e-da-geracao-a-rasca_1484429?all=1
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