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domingo, maio 04, 2008

Hiper-Realismos da Sociedade de Consumo

Imagem daqui

«Eu não gosto do comercio pequeno por opção própria odeio conversa com pessoas que mal conheço adoro a anonimato dos grandes centros comerciais não tenho direito a fazer compras ao domingo?» (Comentário extraído daqui)

Oh meu caro amigo, claro que você tem todos os direitos do mundo, os deveres são para o povinho. Por que raio havia de um senhor como você de se ter que rebaixar a dar os bons dias ao Manuel merceeiro? Você é um executivo de sucesso, leva a semana inteira a bajular os superiores, ao menos ao Domingo que seja você a brilhar. Já o estou mesmo a ver: a sua Maria vem cá abaixo ao snack comprar-lhe o folhado de salsicha e o Record enquanto você se esconde mais um pouco debaixo dos cobertores. Ela chega, prepara-lhe o copo de Ice Tea em bicos de pés para não fazer barulho com os saltos altos não o vá incomodar e você mal ouve a porta do frigorífico logo se afunda mais nos travesseiros entregando-se mais ao sonho: ah, como aquele frigorífico está a abarrotar de coisas que você gosta! Lá vem a maluca que estava ontem no Elefante Branco, a mamalhuda. Traz-lhe um balde de gelo com o champanhe à cama e você fica de boca à banda a vê-la tratar do charuto com todos os requintes de malvadez. Nem lhe pergunta se quer, enfia-lhe o charuto antes que tenha tempo para falar e aproxima-se mais e mais e mais, tanta carne, e você sente-se sufocar sufocar sufocar. Acorda num rompante, a respiração ofegante, taquicardia da pior, e não vê a garina, nem o charuto, afinal tinha o almofadão em cima da cara, que horror. Ó MARIIIIIA!

A mulher entra no quarto, com o ar mais burro deste mundo, os saltos a fazerem um toc toc toc na cabeça do homem. Bom dia querido, chamastes? Trouxe-me o jornal? Claro que sim e o folhadinho já está a aquecer no micro-ondas. O homem atira com a roupa da cama, está agora de cuecas e meias pretas, horrorosamente nu à frente da mulher. Vai direito à casa de banho sempre de mau humor. Estava ele a sonhar com uma gaja tão boa e aparece-lhe este estafermo logo pela manhã, porca vida!

Leva o tabuleiro com os comestíveis em baixela de plásticos para a frente do televisor e bebe sôfrego uma golada de Ice Tea, tem a boca a saber a papéis de música da noite anterior.

Então querido, a que hiper é que vamos hoje?

Sim, hoje é Domingo, dia de irem ao hiper. A mulherzinha já só pensa em fazer figura ao lado do maridão, a encher o carrinho para as outras que lá andam cobiçarem. Olha, estás a ver, já fiz a lista das coisas que temos para comprar. O homem dá um relance e vê logo carradas de erros de ortografia, carradas de sacos cheios de ninharias para carregar para casa. Ainda bem que no hiper pode andar no anonimato!

Lá acabam por sair ambos para um feliz Domingo no hiper. À chegada uma fila de carros, o parque de estacionamento a abarrotar. A mulher ao seu lado não pára de falar mas ele já nem a ouve, está a pensar na melhor forma de dar o golpe do baú aos fundos do QREN e como será em breve fácil despedir aquele gajo que tem a mania que é mais esperto que ele. Dão voltas e voltas à procura de um lugar. Merda! O gajo à sua frente tem o carro que ele gostava de ter. Vira na primeira oportunidade. Ali está um lugar, afinal é um tipo de sorte! Um carro recua com perícia e habilmente come-lhe o lugar. Cambada de sacanas! Grita à Maria que abra o vidro para atirar impropérios ao outro: Filho da P… A loura platinada abre a porta do carro e atira com as mamas para fora da viatura. Reconhece-as. Como está, senhor engenheiro! Fica branco. Ao seu lado a mulher pede-lhe encarecidamente que a lembre de comprar aquele detergente que ela gosta, como é que se chama, o do anúncio, lembras-te querido, que branco mais branco não há. Por que não te calas? O homem volta a arrancar carrancudo. Quase risca o carro a descer mais um nível na rampa vertiginosa em caracol. Lá em baixo arranja um lugar. Dirigem-se em passo apressado, determinado para a escada rolante. A meio da subida cruzam-se, vejam bem, com o senhor Manel. A mulher cumprimenta-o efusiva. O homem atira-lhe um cumprimento superior. Como está o senhor engenheiro? Quase lhe adivinha a ironia no modo como pronuncia a palavra engenheiro. Os merceeiros irritam-no, sabem sempre o que não deviam saber. Finalmente entram no grande templo do consumo, a mulher fica com os olhinhos a brilhar, que emoção. Ele, nem por isso. Apenas sente a liberdade de poder estar ali a um Domingo, depois de tantos anos de regulamentações e centralizações, conseguiu-se os Domingos. Finalmente venceu a ideia liberalista que lhe permite comprar o que quiser, quando quiser, às horas que quiser. A liberdade de estar ali anónimo sem ser visto a carregar sacos e mais sacos ao lado da bronca da esposa. A liberdade que lhe dá o poder de compra, apresentar os cartões de crédito à populaça gulosa. De repente novo cumprimento, desta vez mais familiar: então ó Silva, nas comprinhas? Com está senhor engenheiro? Pior não podia ser: logo o chefe e bem acompanhado. Chatice, ele a querer passar o Domingo na liberdade do anonimato e todos lhe aparecem, logo o chefe. O hipermercado é agora um labirinto sem saída. Quem mais irá encontrar ao Domingo, no hiper?

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