Agora ligo para o segundo canal e lá está o marocas num programa cultural, Câmara Clara -- que raramente vejo.
Sim senhor, o Mário Soares voltou à ribalta, agora farta-se de aparecer na televisão, qualquer dia está como o Hermano Saraiva a continuar caquético a aparecer. Por enquanto ainda não, pois na entrevista que deu à TSF, o alzheimer ainda não o impediu de afirmar que ai isso sim senhor, sem dúvida, meteu mesmo o “socialismo comunista” na gaveta, ora essa, pois claro. E foi dizendo que o Socas era melhor do que ele pensara nos tempos em que andava lá pelo partido a ver se trepava – certamente atendendo ao facto deste último ter mesmo feito arder o verdadeiro socialismo.
Ai este Só Ares, como sempre se lhe chamou cá por casa! Se há gente que o meu pai abominava era este senhor Mário Soares que, do baixo da sua arrogância, lia os jornais estrangeiros (ou escondia-se atrás deles? Pois se ele em línguas é uma negação! Nem o Inglês técnico lá ia!)
O Mário Soares mostrou à Clara a sua apetência por Vítor Hugo e por choucrute. E abominou Becket, e há quem lhe lave as meias, e teve quem o reconhecesse e cumprimentasse na rua de todos os lugares do mundo onde ou já esteve ou vai estar. Havia uma anedota que comparava o Mário Soares a uma abelha, lembram-se? Concluia que ambos ou estão a voar ou a fazer cera.
E o que o meu avô, pai do meu pai, gostava de pranchar o marocas! Passava horas a fazer recortes das caricaturas dos jornais da época e a pintá-las e às vezes acrescentava-lhes comentários ou falas, fazia com eles albuns. Era a sua forma de blogar, agora entendo eu. Queixava-se que a cola se lhe pegava aos dedos e que chegava a ficar com pedaços do papel mas mãos mas isso nunca o impediu de continuar. Tinha um Zé Povinho a fazer um manguito em cartão, em cima do televisor e aquele objecto era muito útil para exercer o seu direito à opinião, recentemente conquistado, e expressar o que pensava das pessoas que via aparecerem na televisão: aparecia o marocas, levava logo com o manguito; aparecia o Easno, levava com ele; aparecia o Carneiro, dá-lhe! Como ele dizia, carregava-lhes no umbigo (o botão da TV) e eles desapareciam. Divertia-se com aquilo, mesmo amargurado com o que ia vendo o Mário Soares fazer ao país e ao que tinha sido a utopia que o 25 de Abril por momentos tornou realidade, a revolução que ele ainda viu, que ele tanto gostou de ter podido assistir! Mesmo amargurado ria-se daquela fantochada e fazia-me lembrar a ideia que eu tinha do Eça, quando lhes aplicava a sua ironia, umas vezes fina, outras vezes mordaz. Partilho-a convosco. Já que anda tão mediático...
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