PROCURA
procuro o teu olhar
redondo
na fresta estreita
do meu corpo
janela-abrigo no limite da insónia
varro o espaço vazio
da escuridão nocturna
noctívago voo
na vã decisão de seguir-te
do parapeito ao divã
do divã
ao centro do mundo
obscuro
desta cegueira de não ver-te
seguro-te talismã
sonho-te amor
neste desastre de ser
invisível
neste pesadelo de soletrar-me
real
tão improvavelmente real
que me escapo por entre os dedos
de quem me queira
guardar
espólio
relíquia
tempo passado
adiante
página em branco
por descuido
ou improviso
como um poema desinspirado
que se força ao papel
só pela violência de alinhar palavras
ordenar sílabas
sem sentido
que não seja este bruto impulso de escrever
como quem de tinta faz sons
por não suportar o silêncio
de estar aqui
tão derramadamente só
sem saber
se o que procuro
é ainda
o teu olhar
Jorge Casimiro
Sem comentários:
Enviar um comentário