segunda-feira, fevereiro 18, 2008

E depois da cheia...

Lisboa: cheias de 1967

Comecei a ver o programa em estreia da Maria Elisa Depois do Adeus. Era sobre as cheias que ocorreram em Portugal em 1967, 1983 e a outra mais recente, parece que ocorrida em 2006, se não estou em erro. Das de 1983 lembro-me eu bem, guardo a imagem da estação de comboios de Algés repleta de água e da aventura de ter que pernoitar em casa de amigos, vendo os rios de água correndo na direcção do Tejo.

Às tantas Helena Roseta chamou a atenção para a questão de se continuar a construir subterraneamente em Lisboa e do que isso revela em termos da mais completa falta de bom senso. Exactamente o que já várias vezes eu disse a algumas pessoas: é completamente irresponsável construir para baixo em Lisboa, não só devido ao elevado risco sísmico mas também porque Lisboa está sujeita à subida do Tejo e construída sobre cursos de água que deviam poder fluir naturalmente consoante as marés e as subidas e descidas do Tejo, além de já ter sido vítima de um tsunami no terramoto de 1755.

Entretanto as nossas sumidades da arquitectura, engenharia e construção, na sua hybris modernaça, aliada à raçuda esperteza saloia, consideram-se pertencentes à primeira raça de imortais, desafiando as forças da Natureza e ignorando as lições da História.

Uma vez levaram-me ao Parque de Estacionamento do Largo do Camões: cinco andares sempre a descer por ali abaixo em curvas apertadas por entre betão já riscado pelas arranhadelas dos hábeis automobilistas, tal é a estreiteza. Obra certamente inspirada por igual estreiteza de ideias ou então talvez pelas habituais "razões económicas", que geralmente se traduzem em fazer as obras mais baratas para as declarar muito para além do orçamento inicial e, meter o dinheiro ao bolso de toda uma corja de patos bravos, engenheiros, arquitectos, fiscais e outros bandidos que tais. Se um dia há qualquer coisa, nem precisa de ser tão grande como outras que já aconteceram, aquilo em segundos converte-se numa tumba de betão e chapa. Nunca mais lá voltei, nem tenciono. E este é apenas um exemplo.

Não é que tenha medo da morte, embora uma morte macaca dessas não convenha a ninguém. Tenho é muito medo da estupidez que é causa da perda e da desgraça alheia. E a estupidez, no tempo de Salazar como no de Sócrates, continua protegida e reinante no nosso país!

3 comentários:

Maria Lisboa disse...

"construída sobre cursos de água que deviam poder fluir naturalmente consoante as marés e as subidas e descidas do Tejo"

Não só por causa do subir e descer, mas também, e essencialmente, porque a Lisboa do Pombal está construída com os materiais da época. Os suportes dos edifícios da baixa pombalina são feitos de madeira. Para que esses suportes se mantenham vivos necessitam de estar mergulhados na água. Se lhes tirarem a água "viva", a água que corre, e os deixarem sem água ou com águas estagnadas, morrem... e se morrerem apodrecem e os edifícios ruem. É esse um dos grandes perigos do corte das linhas de água. O outro, claro que é o das inundações.

Em Algés temos o mesmo problema. Esta zona baixa, especialmente a minha rua, está construída sobre a linha de água. Esta foi canalizada sem ter em conta os dias de grande pluviosidade, por isso sempre que chove como hoje e se calha em hora de maré cheia(já fui várias vezes à janela e a rua já está a encher), a ribeira transborda e começam as inundações. O que a maioria das pessoas não sabe é que a água que as provoca não vem apenas da chuva e da ribeira, mas é também "água" que começa a sair pelos esgotos das casas com caves e rés-do chão.

A memória dos cursos de água é como a memória dos elefantes... tende a voltar aos seus "trilhos" de origem.

As "sumidades" deste país não conseguem perceber que não podem ir contra as forças da natureza (como dizes)... têm que trabalhar em paralelo com elas.

Maria Lisboa disse...

Lembro-me bem das cheias de 68!

Na altura não soubemos das mortes... foram abafadas em todos os OCS.

Sei que nos mobilizámos (não houve aulas, durante 3 dias no liceu de oeiras... não havia combóios, porque as linhas ficaram inoperacionais) para andar por algés a retirar lama e toda a porcaria das casas mais afectadas.

Maria Lisboa disse...

Esqueci-me de referir que há quem considere que este acontecimento constitui, para muitos estudantes, um ponto de viragem nas suas opções políticas, por se terem apercebido que havia mais "vida" para além da que conheciam, "vida" essa a que o governo pouca importância prestava.

Encontras aqui: http://ppresente.wordpress.com/2007/11/26/as-cheias-de-1967/, um texto com um filme onde se fala disso mesmo.

PS: Mais depressa se falassem de inundações, mais depressa elas aconteciam.

Esta noite não dormi nada, até que pelas 5 da manhã com água pelo meio das pernas, numa rua transformada repentinamente em rio, resolvi ir tirar o meu carro e o da minha filha do caminho das águas e passá-lo para a parte de trás do prédio. Também aí a água subiu, mas muito menos do que à frente.

A fotrça das águas subterrâneas era tal que as tampas dos esgotos pareciam "tocar castanholas" e, de vez em quando, deixavam sair jactos de água quais geisers citadinos. Também das sargetas com grelhas se elevavam colunas de água!

Chovia de cima... e de baixo!

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