sexta-feira, maio 09, 2008

Noções de cidadania de acordo com a União Europeia


A Destruição da Educação em Espanha

Intervenção feita, por um delegado espanhol,

na Conferência Operária Europeia

pelo “Não” ao Tratado de Lisboa

(realizada em Paris, a 2 e 3 de Fevereiro de 2008)

Companheiros de toda a Europa, o colectivo de professores de

Trabalhadores e Jovens pela República (TJR), constituído em

Madrid, decidiu contribuir com esta comunicação à

Conferência Operária Europeia para dar a conhecer aos

companheiros a situação específica da educação em Espanha,

reflexo das directivas rumo à privatização que nos chegam de

Bruxelas.

A principal consequência da adaptação do ensino, a todos os

níveis, às necessidades imediatas do mercado (necessidades da

sociedade, como lhes chamam, eufemisticamente) tem sido a

sua destruturação, também a todos os níveis, cujos detalhes

passaremos a expor.

A privatização dos ensinos infantil, primário e secundário

(quer dizer, os ciclos da educação obrigatória em Espanha)

surge determinada por um modelo de acordos, que consiste no

financiamento público de centros privados, quer sejam

creches, colégios ou institutos. A recentemente aprovada Lei

Orgânica da Educação (LOE), que regula estes subsídios,

possibilita e incentiva o desvio de fundos públicos para centros

privados, ao entender que o Ensino já não é um serviço

público, mas um serviço de interesse geral, cuja

responsabilidade já não recai exclusiva nem principalmente

sobre o Estado. É tão grave e alargado o processo de

privatização da escolaridade obrigatória no nosso país que,

para dar apenas um exemplo, na Comunidade de Madrid,

governada pelo sector mais reaccionário do Partido Popular,

das novas vagas oferecidas no ensino secundário para o ano

lectivo de 2007/2008, só uma quarta parte corresponde a

centros públicos, e os outros três quartos pertencem a centros

privados e semi-privados (quer dizer, privados financiados

com fundos públicos). O colectivo de professores de TJR

iniciou diversas campanhas em defesa da Educação pública,

científica, laica e de qualidade, e entre elas encontra-se, como

eixo central, a exigência da revogação da LOE, que se focaliza

na privatização do ensino e permite aberrações como a que

ocorre na Comunidade de Madrid que acabámos de expor.

Submeter o Ensino secundário às necessidades mais imediatas

de um mercado em contínua flutuação leva à destruição da sua

estrutura e à redução dos seus conteúdos. Deste modo, as

disciplinas tradicionalmente fortes (Física, Química, Biologia,

Geologia, Matemática, Geografia, História, Língua, Literatura,

Filosofia) vêem os seus conteúdos limitados, reduzem-se

sistematicamente os seus horários lectivos e a sua importância

dentro do plano de estudos. Assim, por exemplo, as disciplinas

de Língua e Literatura, tradicionalmente separadas, convertem-

se numa só disciplina, o que implica necessariamente a

redução dos seus conteúdos. O caso da Física e da Química

ainda é mais dramático, pois convertem-se em matérias

facultativas da opção científico-tecnológica do bacharelato.

Em troca, surge uma nova disciplina, obrigatória para todos os

ramos do bacharelato, denominada “Ciências para o Mundo

Contemporâneo”, na qual se ensinará aos alunos,

entre outras coisas, “o uso racional dos

medicamentos”, “os estilos de vida saudáveis”,

“as catástrofes naturais”, Internet, ADSL,

telefones portáteis, GPS, etc., em detrimento dos

conteúdos próprios de duas ciências fortes como

são a Física e a Química.

Igualmente, perante a insistência da União

Europeia, aparece no Ensino secundário uma

nova disciplina denominada “Educação para a

Cidadania”, cujo único objectivo é a doutrinação

ideológica dos alunos pois, como se se tratasse

de um catecismo laico, pretende exaltar os

supostos valores da Constituição Espanhola e da

União Europeia, afastando toda a possibilidade

de analisar criticamente esses ditos valores.

Como exemplo, e de acordo com o objectivo

desta disciplina, há a acrescentar que

recentemente os institutos receberam, do

Ministério da Defesa, CD-Roms nos quais se

incentiva os departamentos a incluir no

programa da referida disciplina um tema onde se

fale das bondades do nosso exército nas suas

missões de paz no estrangeiro, sob as ordens do

mandato dos EUA, camuflados por detrás da

ONU ou da NATO. Nesta nova disciplina, como

na novela de Orwell (1984), a guerra é a paz. É a

forma crua encontrada pelo governo de obter

novos soldados que morram ou que matem – no

Líbano, no Afeganistão ou no Kosovo – para

fazer frente às graves dificuldades de

recrutamento que enfrenta a profissionalização

do Exército. O aparecimento desta nova

disciplina surgiu em detrimento da antiga

disciplina de Ética, cujo papel no ensino

secundário será meramente testemunhal, e da

antiga disciplina de Filosofia que, por um lado,

vai ver reduzido o número de horas dentro do

bacharelato e, por outro lado, vai ver os seus

conteúdos seriamente reduzidos, pois

desaparecem todos os temas relacionados com a

metafísica e a filosofia da ciência, ficando

apenas aqueles temas que se referem à filosofia

política, e – mais a mais – orientando-se para

uma possível legitimação acrítica da ordem

existente. O colectivo de professores de TJR

iniciou uma campanha em defesa da Filosofia e

da Ética, considerando estas disciplinas como

necessárias para a formação crítica dos alunos

enquanto cidadãos independentes e autónomos.

2 comentários:

Anónimo disse...

Li o teu post e quase não acreditava no que lia. Quer dizer, que os "panhóis" querem transformar os estudantes em carne para canhão, ao abrigo da nova "ordem" mundial, ou seja, o beija-mão ao Bush e seus lacaios imperialistas.

Pensava eu que era só por cá.....

BJS

o escriba disse...

O espanto é tão grande que só me vem à cabeça "perdoai-lhes Pai, que eles não sabem o que fazem!"

É a realidade a ultrapassar velozmente a ficção!

Onde é que isto vai parar?

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