sábado, julho 26, 2008

o Novipretoguês

Língua Portuguesa é “activo fundamental” (Cavaco Silva)
(ler aqui)

É um facto que eu nunca vou escrever “facto” como se de um fato se tratasse. De facto não é porque de repente um grupo de mentecaptos de fato se lembre de alterar a grafia da Língua Portuguesa que faz com que milhões de pessoas no mundo passem a escrever como eles querem que se passe a escrever. Claro que têm a faca e o queijo na mão para impor a norma: criem-se correctores ortográficos informáticos, espalhem-se pelo mundo lusófono professores amestrados no novo acordo, mandem-se escrever em todos os jornais a Novilíngua. Encontrarão ainda a resistência dos que sabem escrever em bom Português, aqui, no Maputo, no Rio, em Cabo Verde, por toda a parte esses se recusarão a escrever como eles querem. E dos que não hesitarão em começar desde já a pôr a nu o resultado prático deste acordo ortográfico.


A minha pátria é a Língua Portuguesa, disse Pessoa. No curso de Línguas e Literaturas Modernas – Estudos Portugueses, conheci e li autores de todos esses países lusófonos. Se quis melhor conhecer a alma dos cabo verdianos tive que aprender um pouco de crioulo (infelizmente muito pouco). Se todos nos entendemos com mais ou menos variantes, porquê uniformizar o que se quer diverso, criativo? Quer-se criar uma língua una, miscelânea das variantes, que derivaram em línguas autónomas, originais. Não é uma norma artificial, pela imposição de mudanças na grafia, que altera uma língua. A grafia nunca foi coincidente com a oralidade, esta sempre caminhou à frente. As palavras têm um modo de dizer que escapam à grafia, a língua sobrevive sempre por aí, por muitos atentados que façam à grafia. Mas a aprendizagem da língua é formadora, porque as palavras passam a trazer consigo o peso da sua história. A maior parte das pessoas aprende apenas o que lhe ensinam na escola: mal ou bem aprendem a escrever, ou seja, o uso do código. Mas por detrás de cada palavra há uma origem, cuja evolução determinou a forma como se escreve. Criar de repente uma norma, a partir da colagem das variantes, vem impor um corte demasiado artificial. Uma coisa é simplificar uma letra dupla, ou retirar um assento que caiu em desuso por não alterar a forma de dizer a palavra. Agora uniformizar grafias retirando às palavras os seus traços distintivos, isso é castrá-las. Mesmo oralmente eu digo "de facto" soletrando o "c", de uma forma diferente como digo "fato". E no entanto entendo que os brasileiros não o façam. Eu compreendo-os a eles, eles certamente me hã-de compreender também, quer oralmente, quer por escrito.

No próximo ano "letivo" quem irá leccionar?

Em breve vamos ter aí uma geração de engenheiros que saberá escrever correctamente em Novipretoguês, apta a comunicar com os seus parceiros e a negociar com eles, para bom entendedor meia palavra basta. Educados nesse suporte linguístico basicamente artificial (e artificioso), terão cada vez menos ligação com a língua dos seus avós. Despojados do ensino, os clássicos da literatura serão em breve antepassados dos dinossauros escolásticos que já são para a maioria dos alunos portugueses. E já não estou a falar das Cantigas nem do Gil Vicente, refiro-me a obras de há um, dois séculos, Eça, Pessoa, todos os que foram mestres a usar a língua para exprimirem o seu pensamento. Este último viria mesmo a recusar-se a abandonar a grafia do “y”, imposta por um outro acordo, por lhe lembrar o pescoço do cysne. Por isso continuou a escrever como bem lhe apeteceu.
Pergunto-me se alguma vez o Saramago e o Lobo Antunes vão permitir em vida que editem a sua obra em Novipretoguês… Pergunto-me se os Estados vão dar subsídios aos lobbies editoriais que para aí se vão fortalecendo para “traduzirem” as suas obras para Novipretoguês…

O processo de formação dos crioulos é em tudo semelhante, excepto que nasceu da oralidade. Com a necessidade de os colonialistas negociarem com os povos colonizados, simplificaram a sua língua, tipo: eu branco, eu mandar. Tu obedecer. Isto para mais facilmente se fazerem entender. Com o advento da Globalização é agora a língua de origem, o Português que mais se deverá modificar e adaptar às mudanças.
Esta nova língua que querem engendrar é um crioulo artificialmente criado para facilitar negociatas. Mudaram-nos o dinheiro, mudaram-nos os hábitos, querem-nos agora mudar a Língua. Somos um povo cada vez mais aculturado pelas exigências da globalização. A verdadeira globalização não é este desrespeito pelas características que definem os povos. Esta globalização é o capitalismo a minar tudo, a destruir tudo à sua volta.

4 comentários:

ferroadas disse...

A guerra entre portugas e brasucas está aí para durar, eu, vou continuar a escrever como aprendi à mais de cinquenta anos, quero que o acordo vá à merda.

Como esta treta da CPLP é um nado-morto, não chegou sequer a nascer, o que está é virtual, é mais uma forma de uns quantos intelectuais de meia-tijela terem o tacho assegurado, e, aquando das cimeiras!!!! se mostrarem, todos anafados a começar pelo Silva de Boliqueime para acabar no Lula da cachaça. Mais uma tanga que não leva a lado nenhum.

Já agora, que fazem aqueles tipos da Guiné-Equatorial, do Senegal e calculem das Ilhas Maurícias no evento, uns falam espanhol e francês, outros só francês, será que a organização passar-se-há a chamar CPLP(EF)??????? ou CPLP(NC)- Novo Colonialismo????

BJS

o escriba disse...

É palhaçada em cima de palhaçada!
Só falta que nos digam com qual sotaque devemos falar: se brasileiro, se africano, se o do raio que os parta!
Andamos a reboque de tudo e de todos. Sem identidade e língua própria, o que nos resta?

Um abraço
Esperança

Kaotica disse...

ferroadas

O quê?! Esses também lá estavam?! Fica provado que a Língua Portuguesa aqui é o que menos conta!

Essa treta da CPLP deve ser mais um clube!

Proponho que em alturas do acordo entrar em vigor (o querido Lilás socretino diz que é para ser lá para 2011) se faça um blog colectivo onde se faça questão de escrvermos como bem nos apetecer.

Abraços

Kaotica disse...

o escriba

Por mim escolho o do raio que os parta, mas se ficamos à espera desse raio milagroso os palhaços havemos sempre de ser nós.

Boas férias

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