Acredito que Cristo tenha sido um homem perseguido que morreu na cruz. Acredito que tenha sido traído, como muitos foram. Acredito que tenha dito "Pai, porquê eu?" e que não fosse esse o destino que desejava alcançar. Mas não acredito que tenha depois ressuscitado, o que, para mim que não sou cristã, não lhe tira qualquer mérito, antes pelo contrário, prefiro considerá-lo um homem e não um milagre impossível. Acredito que o "milagre" da ressurreição foi o primeiro argumento que alguém bastante calculista se lembrou de inventar para fundar uma religião que ainda hoje vive à custa da crença e da fraqueza dos fracos que precisam de se agarrar às mentiras de uma religião qualquer e se conformam em ser um mero rebanho conduzido. Por isso para mim a Páscoa tem muito pouco significado e prefiro corporizar toda e qualquer metafísica num delicioso chocolate, como a pequena do Álvaro de Campos. Deixo-vos aqui esse pequeno extracto da Tabacaria, como um doce que vos ofereço. Espero que vos aguce o apetite e a inteligência para irem devorar o resto do magistral poema. É esta a minha forma de vos desejar a todos uma Boa Páscoa!
(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
[...]
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)
[...]
Álvaro de Campos, Tabacaria (ler o poema)
6 comentários:
Não tive qualquer formação religiosa, e talvez por isso, a Páscoa é só mais um motivo pra reunir a família em torno de uma mesa farta de doces.
Depois de ler o famoso "O Código da Vinci" afirmei várias vezes que não me chocava nada a humanização de Jesus.
A ser verdade a sua história (até à crucificação), Cristo deixou-nos bons ensinamentos, muitas lições de vida que deveríamos seguir. Deu a vida pelo que pregava e pelo que defendia e morreu às mãos dos romanos defendendo as suas ideias até ao fim... como tantos outros anónimos ao longo dos séculos.
Eu acredito em Cristo e acredito na sua superioridade. Acredito que foi um homem inteligente, um revolucionário, um visionário, um verdadeiro líder. Possivelmente, o maior socialista de todos os tempos... ainda que não tenha ressuscitado e ascendido aos céus.
Cumptos
Excelente!
Para além de pensar o mesmo, prefiro ver Jesus como um homem normalíssimo que foi um bom ser humano, gostei imenso da relação que estabeleceste com a poesia de Álvaro de Campos.
AH! E esses chocolates são uma perdição...
um abraço.
Obrigada pelo saboroso poema com cor de chocolate...
Quanto ao resto, ainda não percebi ( ainda bem que não estou sozinha) por que razão faz tanta confusão a tanta gente que Cristo tivesse sido um homem como outro qualquer. Ninguém lhe tiraria o grande mérito de uma mensagem que perdura por tempos e tempos... até seria muito mais extraordinário... Eu acho...
Boa semana...
Blueminerva
A nossa ideia de Cristo não é diferente. Apenas quero acrescentar que acho que Cristo era um homem forte, capaz de pensar por si próprio e, melhor ainda de agir (a ser verdade o episódio em que expulsou os vendilhões do templo, por ex.) A Igreja, pelo contrário, fez dos seus seguidores homens fracos, sem capacidade reflexiva, seres guiados por uma fé cega, cheios de preconceitos e medos das consequências dos seus "pecados". Cristo certamente não aprovaria que a cristandade fosse assim conduzida em seu nome.
Um abraço e boa semana.
jpg
Pois destes (chocolates) podes tu comer às mancheias que não te hão-de fazer mossa nem borbulhas! Usa e abusa!
Abraços
Renda
100% de acordo. Ainda bem que a net tem este maravilhoso dom de mais cedo ou mais tarde aproximar ideias comuns.
Um enorme abraço!
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