terça-feira, março 25, 2008

Abandono escolar dos pais não abona a favor dos filhos


Na escola dos meus filhos existe um professor que vai ser avaliado porque ele é contratado e a senhora ministra determinou que os contratados começariam este ano logo a ser sujeitos ao novo modelo de avaliação, aquela coisa complicada que para aí apareceu cuja estrutura já foi comparada aos mapas das linhas dos metropolitanos.

O professor é ainda novo e empenhado em apresentar um bom trabalho, além de que este projecto que ele fez, é o projecto em que ele está a trabalhar no seu seminário lá da faculdade.

O tema do projecto tem a ver com segurança na Internet e procura chegar a resultados partindo de inquéritos feitos aos alunos das turmas e aos seus encarregados de educação. Imagine-se um professor que para saber o que os jovens hoje procuram na Internet e também o que eles lá encontram, se traveste virtualmente numa menininha pré-adolescente. Criando uma nova identidade verosímil ele entra nos chats, nos Hi5s, estabelecendo contactos com outras pessoas. Logo o professor chega à conclusão que uma menina daquelas é uma presa fácil, recebendo convites para encontros nada virtuais e sendo assediada por meio de linguagens ou mesmo imagens obscenas.

Entretanto, o mesmo professor ouve um seu aluno falar-lhe de sites onde se ensina a fazer todo o tipo de explosivos caseiros e de um outro onde se ensina a cometer suicídio. O professor fica inseguro, alarmado, receando pelo equílibrio desse seu aluno, porque se preocupa com ele.

No seu projecto está previsto fazer também inquéritos aos pais. Afinal o resultado do estudo é para eles, são eles os principais interessados em salvaguardar e orientar os seus filhos. Mas o que acontece na realidade é que os pais não aparecem para preencher os inquéritos: estes estão disponíveis até na Internet ou mesmo na escola, mas os pais não os solicitam. O resultado é que agora o professor tem mais inquéritos de alunos do que de encarregados de educação. O interessante seria ter a correspondência entre o que uns fazem e entre o que os outros pensam que os seus filhos fazem, quando estão na Internet. Os dados saem pois desequilibrados, sobrando filhos para tão poucos pais. No entanto o professor prossegue o seu trabalho, adaptando-o às circunstâncias: em cada 5 alunos inquiridos, 1 admite já ter tido encontros com pessoas que conheceu através da Internet. Resultados dos pais: nenhum pai ou encarregado de educação tem conhecimento que os seus filhos já se tenham encontrado com pessoas que conheceram via Internet!

Estamos nitidamente perante um grave caso de falta de comunicação entre as gerações. O que é incentivado pelo local onde são colocados em casa os computadores: muitos destes jovens usam a Internet dentro dos seus quartos, sozinhos, sem a presença ou o interesse de qualquer familiar.

Também os professores se sentem sozinhos, abandonados à sua sorte nesta difícil tarefa de ensinar. Procuram a ajuda dos pais mas estes estão alheados, demasiado ocupados pelas suas próprias vidas, com muito pouco tempo para disponibilizar com educação dos seus filhos, com diminuta disponibilidade, grande cansaço e muita falta de atenção e de paciência. O facto dos filhos passarem tempo ocupados na Internet é para eles um descanso: como eles estão em casa, no quarto, pensam que estão quietos, a salvo, e que ali nada lhes poderá acontecer.

Entretanto o professor não sabe mais como alertar os pais para os perigos da Internet. Faz sessões de esclarecimento, apresenta os resultados mas ninguém o ouve, ou apenas muito poucos. Esses lhe agradecem o seu empenho e louvam o seu desempenho, mas são demasiadamente poucos os que o fazem. A maioria nem quer saber. Alguns preferem mesmo nem saber.

4 comentários:

maria_maia disse...

O tema que está denunciado ( e muito bem) neste post, é, INFELIZMENTE, matéria sobejamente conhecida por todos os professores.

Ao longo de cada ano escolar são feitos imensos relatórios devidamente fundamentados e anexados aos projectos curriculares de turma, aos processos dos alunos e às actas de avaliação. Mil e uma denúncias são feitas, mas, ninguém as analisa devidamente nem valoriza os seus conteúdos...

Os problemas de cada turma e as causas do insucesso escolar de cada aluno são SEMPRE bem enumeradas, mas, o professor, debate-se com as dificuldades, SEMPRE SOZINHO...

A articulação escola-família é fundamental existir.

Meg disse...

Kaótica eu não sou professora mas já tive 6 crianças (ainda tenho duas) na escola.

Em casa, para todos, regra nº1, computador na sala onde a família se reúne.
Regra nº 2 - horário préviamente estipulado para utilização do mesmo.

E no fim, uma frase tua que me deixou mais perplexa pela verdade que encerra e que está na base deste miserável estado de coisas.
Dizes tu:

Também os professores se sentem sozinhos, abandonados à sua sorte nesta difícil tarefa de ensinar. Procuram a ajuda dos pais mas estes estão alheados, demasiado ocupados pelas suas próprias vidas,
com muito pouco tempo para disponibilizar com educação dos seus filhos.

Então os filhos não são a vida dos pais? Desde quando? Então é melhor voltarmos à RODA!

Desculpa Kaótica mas isto ultrapassa-me.

Um abraço

maria_maia disse...

Valorizo muito o conteúdo deste post.
Roubei-o todinho. Está
[aqui]

Venho confessar o meu delito para o qual espero ser perdoada.... :)

Kaotica disse...

maria_maia

Está sempre à vontade para levar daqui tudo o que desejar. Quando algo passa a figurar no Pafúncio cai no domínio público, já não é de ninguém e é de todo o mundo.
Ainda bem que o texto serviu a alguém.

Um abraço

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